sexta-feira, 25 de julho de 2008

As alcunhas

A alcunha poderá ser um factor de riqueza, muitas vezes de humanismo, pois pode definir uma força de acção, um procedimento repetido, uma maneira de estar, uma atitude constante ou uma simples tomada de posição. Será o resultado da análise de determinado colectivo que vê e observa, regularmente, cada indivíduo que é alcunhado (é óbvio, que muitas pessoas são alcunhadas depreciativamente).
Estas referências têm, muitas vezes, mais conteúdo e representatividade que o próprio nome da pessoa.
Muitos seres humanos ficam conhecidos para a posteridade pela alcunha que, um dia, lhe foi atribuída. Não temos de ficar melindrados porque os nossos entes queridos, já desaparecidos, são relembrados pela sua alcunha. Por exemplo, o meu bisavô (paterno e materno) era conhecido pelo "Cantata", porque cantava às raparigas (o que hoje se denomina dar piropos), contava-lhes estórias e anedotas para as fazer sorrir, o meu avô materno era o "dr. Canoilo", porque gostava de se apresentar bem vestido, aprumado de costas direitas, quando na presença do sexo feminino (era muito bonito, com uns olhos doces...) e o meu avô paterno era cognomizado pelo "Camarão", pelo seu aspecto forte e de altura exemplar (na década de trinta estava na berra um pugilista, o melhor português de todos os tempos, José Santa, conhecido pelo "Santa Camarão", e o meu avô, pelo seu perfil, foi com ele conotado. Santa Camarão foi recentemente condecorado, a título postumo, pelo Estado Português e tem uma estátua em Ovar, no Largo Santa Camarão, em frente à casa onde morou). Por ser comparado ao Santa Camarão, é para mim, motivo de orgulho, pois o "boxeur" era uma pessoa de uma sensabilidade muito grande, sempre pronto a auxiliar o seu semelhante.
Mas isto das alcunhas já vem de há milhares de anos, os reis de Portugal têm todos um cognome (que não é mais que uma alcunha). D. Afonso I, muitos não sabem quem era, retirou-se o número romano para colocar o nome Henriques, na perspectiva de diferenciar o fundador de Portugal... mas se falarmos no "Conquistador" o leque de conhecedores do rei será aumentado, em largo número.
Assim é (e foi) no Serviço Militar, muitos companheiros são reconhecidos, através dos tempos, pela sua alcunha e/ou pelo seu número de militar.
Na política... Mário Soares é muitas vezes referenciado pelo "bochechas".
Robin dos Bosques (Robin Hood) ou Zé do Telhado (o português), que roubavam aos ricos para dar aos pobres...
Se falarmos em Sebastião José de Carvalho e Melo, muitos desconhecerão quem foi, mas se fizer referência ao seu título "Marquês de Pombal", já quase toda a gente o reconhecerá...
E tantos outros, os grandes guerreiros da História, os jogadores de futebol, os actores, os nossos colegas de trabalho...
Imensas pessoas das nossas aldeias, foram conotadas com uma alcunha, e hoje se falarmos sobre elas, com as novas gerações, referindo os seus nomes (José, João ou Manuel), ficam na dúvida de quem eram, mas se aflorarmos a sua alcunha (seja X, Y ou Z), logo são relembradas e reconhecidas.
A alcunha dá ao indivíduo a força de um estigma, muito para além da sua vida terrena, da vida dos seus filhos, ou dos seus netos...
E neste período contemporâneo, ganhou muita força nas escolas, marcando os alcunhados para o reconhecimento na sua existência. O meu filho é o "pastel" (por ser do Belenenses).
Eu recordo os tempos de escola, de uma forma sentimentalista e carinhosa, quase diariamente... e as alcunhas que foram apostas aos mais diversos colegas, mais os trazem à memória, no contexto universal da própria família escolar...
"Vilas", "Seixal", "Bucelas", "Cagalhão", "Pescada", "Pintassilgo", "Toi", "Faról", "Calmeirão", "Poeta", "Cuspidelas", "Sopas", "Banana", "Monas", "Faísca", "Beethoven", "Lagarto" entre tantas, e tantas, outras... eu era o "Cebolas" (para as meninas o "Cebolinhas")...

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